segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Frenesi



brunoturno.blogspot.com

 As gotas fazem música no telhado. A chuva rala brinca com o céu;
Há cheiro de queimado no ar, da fumaça que pairou pela manhã.

Já são mais de 18h. A voz branda que atravessa o fone de ouvido faz cócegas na alma.
Estou embaralhada. A voz macia sussurra: "I don't know, no I don't know anymore."
 
E eu, eu também não sei...
Não sei o que quero, mas eu quero.

Meu amor, que horas você vai chegar? Passar a chave na porta e
narrar com detalhes as horas passadas?

Que horas faremos juntos as horas seguintes?

Você chegará?

Eu não sei, eu não sei mais
só quero largar esta xícara,

E sair...para ser o que eu ainda posso.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Ímpeto













Não vejo a hora de soltar meus balões coloridos,
de vê-los dançando na imensidão acima de nós.

 

Não vejo a hora de brincar de ciranda com as palavras
ao invés de tentar lutar contra elas. Já não quero ter que arrumá-las.

Anseio vê-las ilegíveis, soltas - como fios de cabelo que se espalham ao vento.

Preciso andar descalça, na areia, no molhado,
nas pedras da minha rua...sentir a textura da vida

sob pálidos pés.

Quero voltar e ir. Ir sem voltar.
Voltar sem sair.

Quero o sol a visitar o meu rosto.

E outro rosto a tocar no meu.

Quero voar sem nem me mover. 

Gargalhar.

Simplesmente me perder para me encontrar.


Já sei o que quero.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Flor no Asfalto


















- Olha, uma flor de plástico!

Deitada entre listras, no chão endurecido, bebendo da chuva. 
Tão viva quanto minha pele recebendo o frio.


 Flor?!


Quem foi capaz de te enxergar, entre pés correndo? 

Agradeço aos olhos que te perceberam e aos ouvidos que me captaram.

Fora eu aquela planta, momentos antes, envolta em plástico, para conservação - pensei, debaixo da sombrinha, fugindo da chuva, sem notar que eu já estava embebida.


Noite cinza, fria, úmida. Bonita.


terça-feira, 23 de abril de 2013

Eterno


nozomi.zip.net

É...

Às vezes a vida fica tão dispersa...como as leves folhas douradas que costumam visitar meu quintal. Algumas delas vêm de outros tempos, de galhos longínquos, de ares remotos, e por aqui ficam.

E deixam tudo tão ordenadamente bagunçado que não entendo! E é para entender? Ordem no caos.

Até que vem o vento, canta forte e arrasta certas folhas ao infinito. O mesmo vento que balança a saia da menina que dança sem caber no próprio corpo.

Algumas de minhas folhas se foram e eu nem vi.

Sem escolha, elas se dissipam no ar. Não tenho a mínima ideia de onde irão parar. Mas se fecho os olhos, ainda é possível ver suas lâminas secas e ouvir a música que fazem sob meus pés, dizendo que existem. Até nem ser preciso mais fechar os olhos. Para mim, ainda estão no quintal, misturando-se às que chegam.

Talvez, as leves folhas douradas permanecessem enfeitando o meu chão de terra. Se não tivesse vento, se não tivesse dança.

Mas quero ver tua saia rodar.


segunda-feira, 11 de março de 2013

Estação

mensagensdiarias.wordpress.com













O tempo passa,
gira

E, algumas vezes
parece que o mundo vai desabar,
bem em cima de nós,

Então, corremos para nos proteger,
da forma que seja

Mas, ainda que alguns estilhaços nos atinjam
Mesmo assim estamos de pé, para o próximo movimento
O tempo passa

E, no entanto,
quase sempre 
pensamos

que ainda somos
a criança andando de bicicleta,
do tempo em que o mal nem sonhava em nascer

Outras vezes
a vida parece nos aninhar
Dando-nos braços, de pessoas amáveis
Sorrisos de árduas conquistas

Ou, ainda, brindando-nos com a tristeza,
da qual precisamos para a superação
Para as tentativas

Sabemos que o tempo passa
E as peças mudam no tabuleiro
E mudou para nós

Estamos mais perto
do que em qualquer passado
Porque assim quis
o afeto

E eu espero ser a mão que ajuda
e  a palavra que incentiva
o próximo passo.

Pra você...
Desejo a brisa
do tempo passando...
Desejo o infinito

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Caleidoscópio

http://portal.rac.com.br



Eu te vi por dentro,
por alguns poucos minutos,
e logo os meus olhos se encheram de cor

Que grandioso cenário,
Tuas palavras montaram
diante de mim.


O dia ficou adornado,
brilhante, vivo.

E o colorido
no meu rosto
realçado por tuas mãos gentis
Fez-me ver

Que a vida surpreende
na singeleza,

E que podemos retocá-la,
realçá-la, acendê-la.
Com inesperados momentos.


Eu te olhei por dentro
e vi belas combinações
de tons.

Pequenos gestos de
nobre amizade.

Obra de arte.
Foi bonito!





sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Asas de Tinta







Ru Felicio
A menina

não quer ficar,
ela quer partir

Para outros planos...
de fundo
Outras imagens
cintilantes

Não quer ficar
Ela quer partir

Suspender os pés
descalços, enfeitados 
de vermelho



Sublime!
Ela quer ir

Tá na pele, 
nos poros, 
nos pássaros.

A menina quer ascender
acender, envolver

O chão já não equilibra
Não satisfaz. Não mais



Ela só quer voar,
avoar

Evoé!



quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Translucidez

Russelli Felicio





















Eu fui a água límpida

do copo vítreo 
que você manuseou
harmoniosamente

você bebeu de mim, absorveu-me
Levou-me para dentro

Eu saciei sua sede momentânea
Fui proveitosa, inevitável

Mas, minha transparência
Fundiu-me ao copo

E logo veio a sentença:
Quebra-se!

Eu fui água pura

Deveria ter sido tinto?
Doce, enigmático,
inebriante?

Você me perceberia
e provaria mais


Tênue, eu?
Eu tenho fogo nos olhos,
Vigor nos lábios

Frágil?
Eu mastigo vidros

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Sob as águas.

By Russelli Felicio




A rua virou rio. Corrente de água. Água corrente. Abundância. 
Corpos tensos a salvar suas coisas. Desde o início da manhã sombria.

Levantem-se ! O céu está se lamentando. Venham ver. 
Ergam isso e aquilo! Tudo o que puderem. Elevem-se!

O tempo corre. Não tão depressa quanto o novo rio. 
Alguém pode tapar as goteiras do céu? Parece que não.

O tempo corre. E já não há mais o que erguer. Foram-se os braços.

O rio já é mar. O estrondo da chuva já é música a escorrer. 
Há pequenos seres voando sobre as águas, 
fabricando desenhos...bonitos - indiferentes ao que se passa.

E quem não pode voar? E quem não tem para onde subir, nem "a coisa" para livrar? Serão levados, pelo frio? 
 Eles têm sido arrastados pelo imensidão invisível de todos os dias?

É o mundo submerso?
Alguém pode fazê-lo emergir?

Talvez o molhar seja preciso.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Morada

http://static.freepik.com


Da janela - ornada com pequenos e irregulares pingos da chuva vespertina, vi minha casa, que já não era minha. A modesta casa de fantásticos sonhos infantis.

O lento movimento daquele veículo me arrebatou para outros tempos. E a vidraça se fez como uma embaçada tela de cinema.

Céus! Era a minha casa...que minha já não era. Um aposento ainda simpático, com seus quatro números presos na fachada de um azul avelhantado e cândido. Nem lembro muito bem de sua cor naqueles tempos. Cor de arco-íris, talvez.

Vi o chão dos meus pequenos pés: a calçada por onde corriam meus irmãos e os outros companheiros - infantes para todo o sempre, amém! O chão, da bandeirinha*, da correria. O mesmo chão, que nada tinha do mesmo.

Avistei a "cadeira na porta", o"ir e vir" do pai e da mãe, a roupa de domingo, a boneca do cabelo desgrenhado e o tão esperado carrinho de pipoca, com sua buzina rouca e feliz.

Em mínimos instantes, fui a menina. Pequena, descalça, dos cachos definidos - e era só o que havia de definido em mim.

É. Parece que o passado nem sempre passa. E o que importa no hoje de que me lembrarei, em alguma pequena viagem no futuro ?



Só um segredo: não é uma casa, é um castelo.





* bandeirinha: jogo, dividido em dois grupos, no qual a bandeira do grupo adversário deve ser capturada.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Das desilusões...






Manhã

É cedo. E Deus já está lavando o caminho de muitos pés.
Lá fora tá tudo da cor da cinza. Cinza do céu. Cinza da saudade queimando.
Cinza da chuva, que traz o frio, o frio que traz o desejo, o desejo que pede o abraço.

Chuva indecisa, que ora desaba forte como a minha vontade de te ver...ora, 
desce calma como a serenidade que ganho na certeza de te ouvir.

Preciso fazer o meu dia lá fora, pôr os pés no caminho. Mas ainda estou parada
no espaço e no tempo. Ainda estou em balbucios  sonolentos da madrugada.
Ainda estou no silêncio da espera. Ainda estou na sua voz.

Estou indo...e sem guarda-chuva.

Florescência



Há dias em que o presente parece seco, infértil, cansado.
Sem ânimo para verter-se em futuro.

O medo, a frustração e a derrota contaminam o solo.

Por isso, preciso arrumar meu quintal. 


Quero quintal de roupa no varal, de borboletas no estômago, 
de sombras de árvores, de criança correndo, de flora.

Do passado? Prefiro dar a mão ao que abriu meu sorriso. 
Só quero o bom dessa saudade.

E assim, espero o dia em que vou acordar - esfregar os olhos acanhados,  sonolentos - e encontrar muitas, muitas flores. Por dentro...de mim.

Grandes e viçosos copos-de-leite, prontos, a nutrir minha alma.

E eis que tudo será flor.

Em breve será.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Aflição






Silêncio. É tarde.

Mas os olhos permanecem acesos, arrebatados, negros - em traquinagem. Eles teimam em presenciar traçados, arranjos, o riscado, o reescrito.

Mas era para ser assim?

As costas doloridas queriam o colchão, forrado com o lençol estampado, surrado, com cheiro de recém-lavado.

Mas, a negritude dos olhos, precisava ver frases, algumas pelo menos, as necessárias.

Só que não poderia ser a todo custo. Haveria de ter leveza, intrepidez. Sim, haveria de ter Audácia!

Então, seria lindo o momento em que a palavra correria, sem  nenhuma ajuda - nada de mão de pai segurando, por trás, o banco da bicicleta do rebento inseguro. A palavra correria, altiva, a ponto de se transformar em muitas: em todas as palavras do mundo.